quinta-feira, 13 de outubro de 2016

Prova de Vida e ligeira pressão sobre a Mesa do Canto

Extorquido em www.distribuicaohoje.pt

- Olha, olha, o xôr Silva. - Pumbas, palmadão nos costados. - Então o que faz aqui no Mercado Abastecedor, e tão cedo, credo, o meu amigo?

Penso se esta será a pergunta mais idiota que se pode fazer a um tasqueiro, no interior de um local onde se vendem géneros alimentícios frescos. Não é. 

Respondo, a sentir duas costelas ligeiramente doridas:

- Estou à procura de forros para caixões. - Reviro ojólhos.

- Pois claro que está e faz você muito bem. - Completamente alheado. - Ainda bem que o encontro, estava mesmo para ligar para o seu estabelecimento. Mas depois ouvi dizer que tinha fechado e isso tudo. - Condoído.

- Claramente exagerada, essa notícia. Parece a morte do outro.

- Ah, pois, por isso os forros. 

- Hã? - Sinto- me a alucinar. Prefiro cogumelos. - Quais forros, homem?

- Ora, para o caixão. 

- Hã? - Esquecido.

- Oh, deixe lá, já não estou a entender nada disto. Parece uma conversa de mudos.

- De surdos. 

- Opá, tanto me faz o paralimpismo. Irra, que você sempre me saiu cá um chato. Olhe lá, preciso de reservar uma mesinha  na Tasca. É para amanhã.

- Pois considere a reserva feita, muito agradecido pela preferência. - Os idiotas clientes, são o meu tipo favorito de idiota. Acho-os fofinhos, até. - E é para quantos? - A fazer contas: tantozidiotas a tantojeuros dá tantos bilhetes prá bola.

 - Ah, não. - Coça o cocuruto. - Sou só eu, mesmo. Queria uma mesa a um canto, se não lhe parecer mal.

- Isso é que não pode ser nada, homem. Só tenho uma Mesa do Canto. E está reservada. - Com ar de arranja-se já outra.

- Ah, pois, que pena. Majolhe, eu posso esperar, não mimporta. A que horas vaga?

- Pois que não faço ideia, amigo. Pode ser depressa, pode demorar uma eternidade. 

- E você mantém isso reservado na mesma? Sem saber?

- Pois claro! - Resoluto.

- Que estranho. Porquê? - Torce a cara num ponto de interrogação.

- Porque a freguesia faz a casa, meu caro. Há coisas pelas quais vale a pena esperar.

- Como belas mamas, poijé Silva? Seu magano. - Pumbas, palmadão no braço esquerdo. Logo o dos quistos, porra.

 - Isso também, está claro. - Este até pode ser idiota, mas num é parvo nenhum.

Dói-me um braço.

2 comentários:

  1. Ó Silva,
    A mesa do canto deve estar mesmo reservada, carago!

    O que me faz lembrar certos dias, nos tempos em que era jovem, alto, louro e esbelto e paravamos na Badalhoca, essa mesmo a famosa Badalhoca que agora é lugar de culto, quando dantes não passava dum tasco... badalhocamente boavisteiro.
    Pois bem, a gente não reservava mesas, mas reservavamos o canto. Para quem nunca foi á Badalhoca, digo-vos que o design estilistico mudou um bocadito. A entrada era um portão de ferro, um patiozinho com os barris de vinho cá fora encimados por uma ramada fanhosa que dava muita parra e pouca uva. Agora tem uma entrada em forma de pipa, o pátio transformou-se em "come em pé", até chegar ao balcão da Lurdinhas.
    Pois bem, dizia aqui o je, que íamos á Badalhoca beber uma cerbejola. Pagavamos e vinhamos para o nosso canto que era no pátio sentados no chão ao lado dos pipos. Até que acabava a cerveja no respectivo recipiente. O que fazer? Jovens, tesos e sedentos da vida, quer dizer, da garganta? Pois bem, nada mais nada menos que reencher a garrafinha da Super Bock com um espadal de se lhe tirar o chapéu. Afinal os pipos ali ao lado clamavam pelo nosso nome. Só um imbecil é que não se deixaria tentar!
    E saímos da Lurdinhas, cambaleantes, zonzos e embriagados. E a Lurdinhas que diga-se de passagem, nunca foi á bola com portistas, desconfiava como é que ficavamos assim, apenas e só com uma cerbejola no bucho!
    Portuguêsmente, toca que deslindar o mistério. Bebida por bebida, toca a dar mais um copo grátis ao bebedolas de todos e os dias e fazer dele um bufo! Tem que resultar... e resultou!
    Tavamos nós no finalzinho da Super Bock da praxe. Levanat o braço esquerdo e passa com o direito a garrafa romanticamente a dar um beijo na torneira do barril do espadal. Encho a garrafa. O primeiro espadal sabe sempre mal, não por poesia, mas porque sabe ainda a cerveja! Há que beber de golada para lavar a garrafa com deve ser. A segunda rodada, essa já deve ser apreciada. O espadal já se sente na garganta - e na mona! Tanto que ao terceiro, já nem reparamos que está um gajo de face vermelha, a espiar-nos, como um bom indio á faroeste! Ao quarto espadal, entra no tasco e avisa a Lurdinhas: tom a foder-lhe o espadal, ó Lurdinhas!
    - Ah os filhos da puta! Eu bi logo que num era cuma cerbeija keles iam abaixo, os filhos da puta. Ladrões! Ó Fredo (filho da Lurdinhas e com tendências a tornar-se mais famoso que a mãe), ó Fredo tom a despejar o pipo (que exagero!!! como se fossemos capazes de deitar abaixo um barril de 50 litros!!!)...

    A nossa relação com a Badalhoca terminou aí. Malditos bufos! Estragam as tradições, as façanhas pueris de uma juventude sequiosa de aprendisagem. De uma juventude ávida de beber cultura! Uma juventude embriagada pelo doce nectar dos anos 70!

    Hoje até doutores, engenheiros e ex-ministros vão á Badalhoca. Sem bufos, sem pipos á entrada e sem... mística! Sim porque a Badalhoca tinha mística. De cor rosé e com um sabor divinal!
    E sem reservas!!!

    Um forte abraço, e desculpa lá o mau hálito...

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    1. Obrigado Felisberto. Mesmo sem ser a mesa do canto, reserve aí o dia 6 do próximo mês. Diz que vamos ocupar uma mesa qualquer.
      Abraço.

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